A Noite de S. Silvestre

Há milhares de anos, ainda quando criaturas extraordinárias caminhavam sobre a Terra e a magia não estava oculta na memória das pessoas, havia uma ilha no meio do Atlântico famosa pelas suas cidades brilhantes e pelos seus avanços civilizacionais. Chamava-se Atlântida. Muitos foram os reis que a governaram, uns mais sábios que outros. Um deles, movido pela arrogância e pela sede de poder, mas também pela inveja, declarou guerra a Atenas, prometendo que a conquistaria. Não poderia haver cidade mais gloriosa que as cidades da Atlântida. Ainda que os deuses o tenham alertado para não desafiar a ira do Olimpo, pois estaria condenado a perder, o rei ignorou-os. Reunindo os seus melhores soldados, avançou pelo oceano na direcção da cidade que tanto cobiçava. Pelo caminho, os deuses avisaram-no novamente: se levantasse a espada sobre Atenas, conheceria a derrota. O rei ignorou os avisos. E assim conheceu o castigo dos deuses. Mal chegados a Atenas, os atlantes foram dominados pela força das espadas dos que guardavam a cidade, que tinham a terra, o fogo, o ar e a água como aliados. Eram os deuses que impunham a derrota, tornando Atenas intocável. E o rei, humilhado, ordenou a retirada. Mas nem assim os deuses o pouparam. Para castigar a ousadia do rei, ordenaram à terra que tremesse, ao mar que se erguesse, ao vento que soprasse e ao fogo que ardesse. E assim sucumbiu a Atlântida, desaparecendo no meio do oceano, engolida para sempre.

Milhares de anos passaram. Foram muitas as marés, foram muitas as luas e os sóis no firmamento. Até ao dia em que Maria, a Senhora, chegou à costa ocidental da Península Ibérica e ali se deixou ficar, olhando o oceano enquanto via o sol desaparecer. E chorou. Era a última noite do ano. S. Silvestre ia a passar naquele momento e perguntou a Maria porque chorava. E ela disse-lhe, Por saudade, por saudade da Atlântida, das suas cidades brilhando no oceano. E por ver que a humanidade ainda se aparenta ao rei que levou a Atlântida à ruína.

S. Silvestre confortou Maria, criando um espectáculo de luzes com as estrelas no céu nocturno. E abraçou-a. Ao aproximar-se, percebeu que as lágrimas da Senhora transformaram-se em pérolas, por efeito da alegria que lhe causara. E de uma dessas pérolas caídas no oceano, exactamente no mesmo lugar onde se erguera em tempos a Atlântida, nasceu, vinda das profundezas da água, a Ilha da Madeira. Ainda hoje, na última noite do ano, homens e mulheres lançam ao céu luzes que ardem, para lembrar a noite em que S. Silvestre confortou Maria e a Atlântida voltou a erguer-se da escuridão com outro nome.

Este é um mito tradicional português de uma das noites mais mágicas do ano. Reconto-o para que, nesta noite de fim de ano, nesta Noite de S. Silvestre, haja magia e luz em todas as casas, em todas as mãos que se encontrarem em abraços, em todos os corações.

Feliz 2019!

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