Bibliofilia é o amor aos livros. Porque para mim o amor ao livro é, mais do que o amor ao objecto em si, amar o que ele traz dentro: o conhecimento. Aqui partilho livros da minha estante, que vão da literatura aos dicionários, da gastronomia aos atlas, dos livros práticos à espiritualidade. São as minhas escolhas pessoais e diversas, sem a pretensão de fazer crítica. Apenas amigáveis sugestões de leitura, como quem passa um livro de mão em mão.

Hoje apeteceu-me escrever sobre o mais recente livro que chegou à minha estante: Procura a Ática, da poeta Marília Miranda Lopes, publicado pela editora Labirinto em 2020. Terminei de o ler na semana passada – fi-lo passar à frente de tantos outros livros que tenho para ler. Mas um novo livro de Marília Miranda Lopes não poderia ficar à espera.
Tive oportunidade de conhecer a autora em Maio de 2013, no lançamento do livro Castas, no Instituto da Vinha e do Vinho, em Lisboa. E desde então tenho acompanhado o seu trabalho poético, no qual me revejo muito, seja pelos temas que visita, seja pelo lirismo da sua linguagem, seja por dar continuidade às tradições rurais, culturais e literárias, trazendo-as para a luz da contemporaneidade.
Em Procura a Ática, Marília Miranda Lopes guia-nos por referências da Grécia, mitológicas, históricas e toponímicas, sempre tão caras à tradição literária portuguesa, mas também pelas referências de uma Europa moderna, refém da automatização, da tecnologia e da desumanidade. Diria que é um livro com linhagem, na medida em que herda o que de bem se tem feito na literatura portuguesa nas revisitações às referências cultas da língua e da cultura, de Camões a Sophia de Mello Breyner Andresen. É um dos fados da nossa literatura, este de se voltar para a Antiguidade Clássica, sempre em busca de se ressignificar.
Gosto particularmente da forma como Marília Miranda Lopes recuperou no livro as formas e as temáticas poéticas tradicionais, como os vilancetes, os sonetos, as canções, as estâncias, as éclogas, as elegias, as orações, levando-nos a transitar de imagens profanas para imagens sagradas como quem cruza portais entre dimensões, sempre guiados pela voz matricial, de sacerdotisa, da poeta. Além disso, como já referi, aprecio muito a linguagem lírica de Marília Miranda Lopes, os poemas esculpidos, a escrita depurada. “Escrita depurada” essa que, como a autora refere, está também na palavra “Ática”. E o livro contém também esse desejo de purificação, do que é dito e do que é vivido.
Faz-me muito sentido deixá-lo aqui como sugestão de leitura, numa época de tanto ruído e de escuta tão escassa, em que a depuração se revela necessária para uma melhor compreensão do mundo.
